Market Analysis Brasil e Instituto Akatu constatam que índice sobre Greenwashing permanece praticamente o mesmo após dez anos
Editado por Flavius Deliberalli
O Greenwashing, prática de empresas que utilizam alegações ambientais enganosas para promover uma imagem sustentável sem um compromisso real com o meio ambiente, continua sendo uma realidade preocupante no Brasil. Segundo o novo estudo Greenwashing no Brasil: um estudo sobre as alegações ambientais nos produtos – Edição 2024, realizado pela Market Analysis Brasil com o apoio do Instituto Akatu, 85% das alegações ambientais em produtos vendidos no país são falsas ou enganosas, um índice semelhante ao registrado há dez anos, que era de 83%. Isso indica que, apesar do aumento do discurso verde no mercado, a transparência das marcas ainda não evoluiu na mesma proporção.
O estudo analisou 2.098 produtos de diferentes categorias, identificando um total de 3.045 alegações ambientais. O número de promessas ecológicas cresceu 28% desde 2014, mas os dados mostram que muitas companhias no mercado não têm respaldo em algum dos selos verdes disponíveis no Brasil para certificação. Os dados da pesquisa mostram também que os consumidores brasileiros seguem expostos a informações incertas a respeito da responsabilidade ambiental das marcas disponíveis no varejo brasileiro.
“O estudo mostra os desafios que as empresas enfrentam para transformar discurso em prática quando o assunto é sustentabilidade, o tão celebrado ‘walk the talk’. A abundância de selos e promessas ambientais sem base real pode gerar ceticismo e acabar prejudicando não só as marcas que adotam essa estratégia, mas também o próprio ideal de sustentabilidade. Por outro lado, o fato de tantas empresas quererem se posicionar como sustentáveis indica que a preocupação ambiental já se tornou um valor essencial no mundo dos negócios”, explica Fabián Echegaray, fundador e diretor geral da Market Analysis Brasil.
Entre os diferentes tipos de Greenwashing identificados, o mais comum foi o da “Incerteza”, presente em 57% dos produtos analisados. Essa prática ocorre quando uma marca utiliza declarações vagas e subjetivas, como “eco-friendly”, “sustentável” ou “amigo do meio ambiente”, sem aprofundamento ou comprovação concreta sobre o real impacto ambiental do produto. A falta de clareza pode prejudicar a decisão de compra dos consumidores que desejam fazer escolhas mais sustentáveis, uma vez que não têm informações suficientes para avaliar se um produto é, de fato, ambientalmente responsável.
“Uma comunicação clara e baseada em dados confiáveis é essencial para que o consumidor possa tomar decisões de compra mais conscientes. Quando as empresas adotam uma linguagem acessível e transparente sobre seus compromissos ambientais, fortalecem a confiança do público e incentivam práticas reais de sustentabilidade no mercado”, explica Lucio Vicente, diretor geral do Instituto Akatu.
Outros problemas identificados no estudo incluem “Falta de prova” (17%), que ocorre quando uma alegação ambiental não tem respaldo verificável, como “biodegradável” sem certificações reconhecidas, e “Irrelevância” (16%), que ocorre quando empresas destacam como diferencial sustentável características que já são obrigatórias por lei, como “não contém CFC” em aerossóis.
Setores que mais praticam greenwashing
O estudo aponta ainda que algumas categorias de produtos se destacam negativamente pela alta taxa de alegações que, pela pesquisa, indicam uso de Greenwashing. Entre os segmentos analisados, os que mais se destacam são produtos de limpeza: 96%; casa, jardim e construção: 86%; eletroeletrônicos e acessórios: 86% e cosméticos e higiene pessoal: 75%. No caso dos produtos de limpeza, a pesquisa revelou um aumento preocupante de 27% na quantidade de alegações verdes sem comprovação em relação à pesquisa de 2014.
Já no setor de eletroeletrônicos houve ligeira melhora: a quantidade de produtos com certificações ambientais falsas caiu de 89% em 2014 para 86% em 2024. Por outro lado, houve melhora importante no setor de brinquedos, onde o índice era de 84% em 2014 e foi para 72% em 2024. Melhores números também no setor de cosméticos e higiene pessoal, passando de 81% em 2014 para 75% em 2024.
“Quanto mais um produto faz parte do dia a dia das pessoas, maior parece ser a tentação das empresas de exagerar seus benefícios ambientais. Como preço, funcionalidade e aparência são parecidos entre as marcas, fabricantes de produtos de limpeza recorrem a alegações sustentáveis para se destacar. Ao mesmo tempo, a variedade de estratégias de Greenwashing, como a diversificação dos pecados e a predominância da ‘incerteza’, mostra como muitas empresas preferem evitar conflitos, usando termos vagos e ambíguos em vez de assumir um posicionamento claro. Assim, elas tentam se manter relevantes apostando na sustentabilidade, mas sem correr grandes riscos”, conta Fabián.
Consumidores mais atentos
A pesquisa também identificou um aumento no comportamento de premiar ou punir marcas de acordo com suas práticas ambientais. Em 2010, apenas 22% dos consumidores afirmavam recompensar empresas sustentáveis comprando seus produtos ou falando bem delas. Em 2023, esse número subiu para 32%. Por outro lado, a punição às empresas que praticam Greenwashing também cresceu: enquanto 10% dos consumidores boicotavam marcas em 2010, em 2023 esse índice chegou a 22%.
“Os consumidores são protagonistas na construção de um futuro verdadeiramente sustentável. Ao questionar práticas e buscar transparência, cada pessoa pode transformar o mercado em um aliado do meio ambiente. Trata-se de diálogo: ao valorizar marcas comprometidas com ações concretas, incentivamos a ética e a inovação responsável”, explica Lucio Vicente.
Os desafios para o futuro
Embora os consumidores demonstrem maior engajamento com a sustentabilidade, o estudo também aponta que a confiança nas alegações ambientais tem sido abalada pela percepção do esvaziamento do discurso da sustentabilidade. Entre 2019 e 2023 houve uma leve queda na porcentagem de consumidores que acreditam que o consumo pode mudar o comportamento das empresas, caindo de 85% para 77%.
Todo o cenário nos leva a uma reflexão: as empresas conhecem a fundo suas cadeias de produção? Como podem comunicar com mais transparência seus processos para ajudar os consumidores a tomarem decisões mais informadas sobre sustentabilidade? Há uma oportunidade para que compartilhem mais conhecimento e esclareçam melhor os impactos de seus produtos?
“Este cenário nos convida para uma reflexão importante: quando empresas não têm seus discursos alinhados à prática, abalam a crença na sustentabilidade e levam o consumidor a escolher produtos e serviços de maneira equivocada. Em um mundo em que as pessoas não toleram mais serem enganadas, as empresas que não investirem em comunicações claras, transparentes e elucidativas, tendem a perder a preferência e seus mercados”, finaliza Lucio Vicente.
A pesquisa completa está disponível aqui.
Mais informações:
Market Analysis Brasil
www.marketanalysis.com.br
Instituto Akatu
www.akatu.org.br