Publicidade

E se a nossa moeda fosse impacto ambiental?

Compartilhar

Em artigo, autor propõe reflexão sobre mudança de hábitos e paradigmas

Por Ricardo Sastre*


Quando atuamos diretamente na área de preservação ambiental, é comum pararmos para pensar nas causas que nos levaram para este estado atual de extremo alerta em relação ao esgotamento do planeta, para entender quais são os caminhos para contribuir com a mudança deste cenário. Para tanto, isso exige soluções escaláveis e compatíveis com a cultura existente. Entende-se que as mudanças de comportamento ocorrerão gradativamente, pois é muito difícil a inserção de projetos disruptivos em uma sociedade com um pensamento capitalista e linear.

Por outro lado, além de buscar soluções que se adaptem ao presente, se exercita o olhar futurista e busca-se desenhar cenários baseados em dados. Em uma dessas epifanias para salvar o planeta, emergiu uma ideia utópica para responsabilizar e conscientizar as pessoas sobre a real necessidade em reduzir o impacto ambiental. O planeta esgotou!

Em 2011 foi lançado um filme chamado “O preço do amanhã”, que propõe controlar o envelhecimento para evitar uma superpopulação no planeta, através da adoção do tempo como a principal moeda de troca para sobrevivência e na obtenção de riqueza. Desta forma, os ricos vivem mais que os pobres, que acabavam negociando a própria sobrevivência. Neste caso, o dinheiro como nós conhecemos não tinha validade.

Se pensarmos nessa mesma lógica de substituição de valores para a sociedade e adotarmos a escala da pegada ecológica como métrica para avaliação de impacto das atividades humanas no meio ambiente, facilmente podemos pensar em substituir o dinheiro por uma moeda chamada de impacto ambiental. Ou seja, quanto maior o dano no planeta, mais caro seria a sobrevivência, preservando a lógica de que cada ser humano teria que se manter com uma mesma cota durante a vida.

A pegada ecológica mede a área de terra e água necessária para sustentar o estilo de vida de uma pessoa, comunidade ou país, considerando a capacidade da terra em regenerar os seus recursos. Em síntese, ela compara a demanda de recursos naturais com a sua oferta, entendendo se estamos utilizando mais recursos do que o planeta regenera. Este cálculo inclui as áreas utilizadas para agricultura, pesca, geração de energia, produção de insumos, construções e emissão de gases e geração de efluentes.

O nível recomendado para a manutenção do planeta é de 1,7 Gha (hectares globais) por pessoa. Países como os Emirados Árabes, Catar e Estados Unidos chegam a consumir mais de 10 hectares por pessoa. Países considerados pobres, como Ruanda, Paquistão e Etiópia, consomem menos de 1 hectare por pessoa. Esta comparação revela, dentre outros fatores, a desigualdade social no planeta.

Em um modelo de educação que considera “mexer no bolso” como uma punição por não cumprir determinadas regras sociais, adotar o impacto ambiental como a moeda oficial poderia gerar uma mudança radical na maneira em que vivemos atualmente. Possivelmente teríamos mais ações compartilhadas e ocuparíamos menos espaço para viver.

Ter um carro circulando sem todos os bancos ocupados seria muito caro, casas grandes com salas enormes, quartos vazios e cômodos pouco utilizados não seriam mais vistos. Excesso de embalagens e desperdícios de recursos eliminariam automaticamente os produtos do mercado. Marcas competitivas seriam aquelas que utilizariam os recursos de maneira consciente. As pessoas ricas consumiriam menos e economizariam recursos, teriam uma poupança de impacto ambiental para serem utilizadas em momentos de emergência como um tratamento de saúde.

Os empreendedores teriam que doar uma parte do seu impacto ambiental para desenvolver suas empresas. Isto soa familiar? Em nosso mundo atual, trocamos tempo de vida por dinheiro!

Este artigo serve como um pequeno exercício para pensarmos em uma mudança de paradigma e refletir sobre nossos hábitos. Afinal, porque adotamos este modelo de vida em sociedade em que o dinheiro e o consumo prevalecem, sempre em nome do bem-estar pessoal e social e do poder? Os pequenos e genuínos prazeres da vida tendem a custar muito pouco ou nada, como um afeto, boas relações humanas, a contemplação da natureza, adquirir conhecimento e o amor no sentido amplo da palavra.

Convido os leitores para imaginarem outros exemplos e os seus reflexos se adotássemos essa nova forma de monetização.


**As opiniões expressas e os dados apresentados em artigos são de inteira responsabilidade de seus autores e não representam, necessariamente, o posicionamento dos editores do Conecta Verde.
 

Conteúdo por:

Ricardo Sastre*

*Com 28 anos de experiência no mercado de embalagens, é publicitário; especialista em expressão gráfica e gestão empresarial; mestre em design; doutor em engenharia de produção e pós-doutor em design sustentável; pesquisador; músico; consultor; escritor; professor universitário; diretor na Mudrá Design e presidente da Apdesign-RS.

Deixe um comentário

Recomendados para você

Pesquisar

Publicidade

Últimas notícias

Temas mais publicados